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Empreendedoras de startups denunciam assédio em carta, e exigem compromisso da Abstartups sobre o tema; entenda

Texto denuncia práticas de assédio no ecossistema de inovação brasileiro e exige o compromisso da entidade sobre o tema

Empreendedoras de startups denunciam assédio em carta, e exigem compromisso da Abstartups sobre o tema; entenda

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10 min

24 mar 2023

Atualizado: 19 mai 2023

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Na última quinta-feira (23), empreendedoras de startups se juntaram para assinar uma carta contra o assédio no ecossistema de empreendedorismo e inovação brasileiro. O documento, endereçado à Associação Brasileira de Startups (Abstartups), denuncia comportamentos morais, sexuais, étnicos e sociais e cobra o compromisso da entidade em ajudar a erradicar o assédio em todas as suas formas.

“Reconhecemos que, no passado, ações e comportamentos inaceitáveis, como assédio moral, sexual, étnico e social, foram tolerados. No entanto, estamos convencidos de que é hora de enfrentar e eliminar tais comportamentos, fomentando um ambiente mais inclusivo e respeitoso para todas as pessoas. O assédio compromete o bem-estar físico e emocional das vítimas, limita oportunidades e inibe a criatividade e a inovação em nosso setor. Não podemos mais tolerar a perpetuação dessas práticas em nossa comunidade”, diz o texto.

A carta foi escrita de forma colaborativa e não divulga o nome das vítimas e dos signatários, nem detalha casos de assédio ou aponta os culpados pelos atos. No entanto, exige que mudanças sejam tomadas para que as práticas deixem de ocorrer. 

“Exigimos um compromisso firme e transparente para promover um ecossistema de startups e inovação livre de assédio e construir um futuro onde todos possam prosperar e contribuir com seu talento e criatividade.” Até a publicação desta reportagem, mais de mil assinaturas já tinham sido firmadas no site.

“Precisamos de aliados inesperados. Precisamos de quem está com a caneta pesada em locais de poder se indignarem e agirem. Assédio rouba nossa dignidade, nossa energia e nossa autoestima. Como empreender e inovar preocupada em ser machucada, invadida, não validada?”, questiona Dani Junco, fundadora e CEO da socialtech B2Mamy, ao Startups.

Exigências à entidade

O documento demanda que a Abstartups estabeleça um comitê independente, isonômico e transparente responsável por criar e sugerir políticas de prevenção e combate ao assédio em todas as suas formas. Além disso, pede que se desenvolvam mecanismos eficazes e confidenciais de denúncia e apoio à investigação que protejam a identidade das vítimas e as apoiem na responsabilização das pessoas assediadoras.

“Reconhecendo a importância da entidade no ecossistema, exigimos que promovam a formação e capacitação contínua sobre questões relacionadas ao assédio e à diversidade; que estimulem a colaboração entre as pessoas empreendedoras, investidoras, governos e organizações da sociedade civil para compartilhar boas práticas, desenvolver soluções inovadoras e criar um ecossistema de apoio às vítimas de assédio. E que defendam e apoiem a identificação e a devida punição das pessoas assediadoras, assegurando a aplicação das consequências apropriadas, independentemente de seu status ou posição.”

“Segundo dados de um estudo da Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (Aberje), 72% das brasileiras sofreram assédio no trabalho. Esse dado expressivo demonstra a importância do movimento contra o assédio no ecossistema de empreendedorismo e inovação do Brasil”, diz Marina Ratton, CEO e co-fundadora da Lilit & Feel, ao Startups.

Como CEO da Feel, femtech voltada para o autocuidado íntimo feminino, ela afirma que um ambiente corporativo seguro é fundamental para que seja possível não só levantar investimentos, mas também garantir a segurança das mulheres em situação de vulnerabilidade. “É necessário haver um compromisso ético do ecossistema de startups com a preservação das mulheres, pois casos assim impactam índices de inovação e a força do empreendedorismo feminino. Nunca enfrentamos uma situação como essa, mas um ambiente não seguro não desenvolve um ambiente ético como o nosso”, pontua.

Para Isabela Corrêa, CEO e co-fundadora da B.NOUS, é fundamental que a Abstartups, com toda sua relevância e importância a nível nacional, levante essa bandeira. “Assédio é inegociável. É algo que a gente tem que lutar e combater em todo ambiente e, principalmente, no ecossistema de inovação e empreendedorismo. Estamos sempre ganhando maturidade em gestão, networking, eficiência, e investimento, mas também precisamos amadurecer no ponto de vista das relações humanas, da ética e do respeito”, analisa.

Ela conta que ao longo de sua trajetória enfrentou situações de desrespeito. “Isso precisa ser cada vez mais falado e trabalhado. Temos muitas ferramentas para isso, no próprio ecossistema, que propiciam denúncias e o tratamento correto desse tipo de situação. Não há mais desculpas para as pessoas não encararem essas situações de forma séria e não darem os devidos encaminhamentos. Não há mais espaço para não ser algo tratado com a seriedade que deve ser.”


Resposta da Abstartups

Na manhã desta sexta-feira (24), a associação respondeu à petição dizendo repudiar toda e qualquer forma de assédio, mas reforçando que seu alcance sobre a questão é limitado. “Em que pese nos posicionamentos firmemente contra o assédio, na condição de associação setorial, nosso alcance é limitado. Nossa capacidade de influência no ecossistema, ainda que com alguma relevância, não alcança poderes executivo ou fiscalizatório”, disse a Abstartups, em nota.

A entidade destaca a importância de empresas e agentes do ecossistema, vinculados ou não a startups, também devem se comprometer com a questão, promovendo boas práticas e seus próprios mecanismos de denúncia e investigação independentes, com uma cultura organizacional voltada para o ser humano e com respeito à lei brasileira.

“Nosso papel é incentivar fortemente esse tipo de consciência entre nossas associadas, mantenedoras e parceiras públicas e privadas. Atuar e promover campanhas e ações de conscientização social nas mais diversas áreas ligadas ao seu fim social é, inclusive, uma das finalidades estatutárias de nossa entidade”, pontua.

Ainda assim, a instituição se comprometeu a adotar algumas medidas nas próximas semanas. Entre elas, a criação de um grupo de trabalho com empresas e profissionais para desenvolver um guia de boas práticas de prevenção e combate ao assédio no ambiente de startups; e a realização de eventos e campanhas nas redes sociais de conscientização sobre o tema.

A Abstartups afirma que vai criar boas práticas específicas para eventos promovidos exclusivamente pela associação, com orientações sobre como agir nesses casos; fazer parcerias com empresas que forneçam tratamento adequado para acolher vítimas de assédio e incluir este guia como dever associativo para empresas ingressantes no quadro de associados e parceiros da associação.

Carolina Perroni Sanvicente, co-fundadora do escritório Perroni Sanvicente & Schirmer Advogados (PS&S), focado em operações de venture capital no país, ressalta que as ações devem abranger todo o empresariado, e não apenas o ecossistema de inovação. “A preocupação com esse tema deve ser prioridade sempre, não pode ser apenas algo ‘para inglês ver’. De nada adianta um canal de denúncia se quem verifica e investiga as denúncias não estão preparados para tal ação”, diz Carolina, ao Startups.

“Grandes redes varejistas já têm departamentos que investigam esses tipos de denúncias e respondem ao Conselho de Administração. Também há muitas empresas terceirizadas fazendo esse trabalho, então não há mais desculpas para que as empresas continuem com o discurso de: ‘somos um negócio pequeno e não temos como ter um departamento para isso no momento’. Não podemos esquecer que já existem muitas ferramentas que facilitam esse mapeamento, mas é necessário querer tratar o tema com seriedade e comprometimento”, conclui.

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