O movimento surge em um cenário em que metade das mães são demitidas do emprego em até 2 anos depois de voltar de licença-maternidade.
(Foto: ReMa via Getty Images)
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13 min
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29 set 2021
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Atualizado: 19 mai 2023
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Por Sabrina Bezerra.
Na contramão de um tabu existente no mundo corporativo, empresas como 99, Hotmart, Pineapple e Singu contratam e promovem grávidas e mães de crianças.
O movimento surge em um cenário em que as barreiras para mães são enormes: metade delas são demitidas do emprego em até 2 anos depois de voltar de licença-maternidade, segundo dados da FGV.
Além disso, enfrentam desigualdade de gênero. Segundo as Estatísticas de Gênero do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o nível de ocupação de mulheres mães — entre 25 e 49 anos — que têm crianças de até 3 anos é de 54,6%. O dos homens — no mesmo cenário — é de 89,2%.
“A adoção de qualquer prática discriminatória, seja por gênero, origem, deficiência, idade, entre outros, é proibida por lei”, diz Andrea Massei, sócia da área trabalhista do Machado Meyer. Apesar disso, algumas mães relatam preconceito durante os processos seletivos.
É o caso da Sara Paez, psicóloga e especialista em recursos humanos. “Eu fazia uma série de entrevistas, mas não passava. O feedback das empresas era sempre esfarrapado. Foi quando percebi que não me contratavam porque a Valentina, à época com 8 meses, era um bebê pequeno”, conta ela.
As perguntas durante a conversa com os recrutadores eram sempre as mesmas: “'Você pretende ter filhos? Você tem filhos? E se ficar doente, o que você vai fazer? Quem cuida dela?' Ao ouvir esses questionamentos pensei: 'É. O preconceito com as mães existe. Parece que a gente entra numa bolha da maternidade", afirma Sara.
E por que as companhias ainda têm esse comportamento? Segundo Tais Targa, psicóloga e especialista em carreira, um dos motivos é a ausência no trabalho para levar a criança ao pediatra, por exemplo. “As empresas acham que a performance [das colaboradoras] vai cair”, diz a especialista.
No caso de mulheres grávidas, "a barreira de entrada aumenta por conta das questões de licença-maternidade", conta Carolina Martins, psicóloga e especialista em carreira.
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Se você já fez as perguntas do tópico acima aos candidatos, se questione o porquê. É o que aconselha Sara. “Qual a razão desses questionamentos se não têm relevância com as habilidades profissionais?”, diz ela. “Esses scripts se tornaram clichês. Mas não têm sentido. (...) Se a candidata está procurando emprego, é porque ela tem uma rede de apoio”, completa.
Ou seja, a entrevista de emprego deve ter o foco nas qualificações profissionais que são relevantes para a posição ocupada. “Não tem importância profissional se a candidata tem ou não filhos. A escolha deve ser pautada pelos critérios da vaga que está aberta”, conta Andrea Massei, sócia da área trabalhista do Machado Meyer.
Segundo a advogada, o ideal é perguntar se a profissional tem filhos após a contratação. “Para incluir os benefícios como auxílio-creche, convênio médico, entre outros."
Além disso, “as empresas devem pensar no acolhimento dessa mulher dentro da empresa. (…) Como? Oferecendo espaço para fazer a retirada do leite com a bombinha e creche interna, por exemplo”, diz Sara.
Segundo Carolina, o ideal é se preparar para responder com credibilidade e segurança. “Diga que sim, a idade deles e com quem fica”, diz ela.
“Você deve reagir normalmente ao ser questionada se tem filhos. Seja simpática e responda com integridade e verdade”, aconselha Tais Targa.
No entanto, se não se sentir à vontade, não precisa responder. “Você pode questionar o recrutador: Por que preciso passar essa informação? Por que ela é relevante?”, aconselha Andrea Massei.
Muitos “nãos”… Receber muitos "nãos" nos processos seletivos desestabiliza. “Mas pensa na questão do livramento. Se você sentir que foi reprovada por estar grávida ou ter filhos, veja por esse lado: se a empresa já tem essa discriminação na porta de entrada, imagine do lado de dentro”, conta Carolina.
A empresa ingressou junto com a Bloom na campanha #ContrateGrávidas. “Nos comprometemos em continuar realizando um processo seletivo justo, humano e acolhedor. Por isso, queremos reafirmar que sim, TODAS as nossas #vagas estão abertas para pessoas #grávidas!”, disse a companhia.
Para Luciana Andreotti, diretora de recursos humanos e diversidade da 99, apoiar publicamente incentiva outras marcas a fazerem o mesmo. “Quando o dado vira público, nós mostramos que é uma questão social e, contratar grávidas e mães de crianças não é e nem deveria ser um impeditivo”, diz em entrevista à StartSe.
Segundo Cesar Barboza, diretor de Talentos da Hotmart, para a companhia, “só se constrói uma cultura forte e permanente quando se contrata pessoas que compram essa ideia. E aqui temos um time de talentos (…) que entende isso e, portanto, sabe que perguntas como momento pessoal, orientação sexual, raça, gênero e demais não devem ser feitas nunca como uma forma de seleção”, conta.
A empresa não divulga quantas grávidas e mães já foram contratadas, mas conta o caso da funcionária Renata Fortunato, que foi promovida a gerente na mesma semana em que avisou para a Hotmart que estava grávida.
Em entrevista à StartSe, ela disse: “logo após a notícia da gravidez também recebi a notícia da minha promoção. Foi apenas 15 dias depois. Foi um momento bem intenso, mas de muita felicidade. De fato, a oportunidade era bem clara e era muito para o meu perfil. Fazia sentido. Em um momento diferente, talvez fosse mais esperado do que estando grávida, mas foi uma escolha clara e para além da minha condição extra profissional”.
A agência de relações públicas especializada no atendimento de scale-ups fomenta a contratação de mães para reduzir o gap do mercado. “Nós vimos que faltava esse olhar no setor de inovação, muito dominado por homens. (…) A maternidade é um dos pontos mais sensíveis nesse cenário, já que muitas mulheres acabam sendo deixadas de lado uma vez que se tornam mães e chegam até a desistir de suas carreiras por não encontrarem condições favoráveis no mercado”, diz a empresa em comunicado.
Pensando nisso, a Pineapple promoveu — de coordenadora a head de atendimento — Mariana Riccioppo, uma de suas funcionárias que estava grávida no 9º mês de gestação. “É um privilégio sem tamanho estar nessa posição, principalmente em um momento socioeconômico tão desafiador quanto o que vivemos. Espero que o mercado deixe de ver a maternidade como um obstáculo profissional e casos como o meu não sejam a exceção à regra, gerando oportunidades como esta para muitas outras mães”, comenta Mariana.
O marketplace de beleza e bem-estar seguiu a mesma linha da Pineapple ao promover — de CFO para Co-CEO — Maria Isabel Antonini quando estava grávida. “Agora, Maria Isabel lidera a startup em um momento muito especial para a marca, já que 67% do escritório é atualmente composto por mulheres, 63% delas em cargos de liderança”, diz a empresa. O número de funcionárias com filhos pequenos é de aproximadamente 15% do quadro geral.
Fique por dentro de todas as inovações da área de recursos humanos no SVWC, evento online e gratuito da StartSe, no dia 21 de outubro. Quer spoiler de alguns participantes? Sim? Então, veja só: Gustavo Vitti, VP de People no iFood; Karen Sandhof, VP de People, Performance & Delivery na Creditas; Filipe Roloff, D&I Learning Coordinator no Nubank; e muito, muito mais. Faça a sua inscrição!
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Sabrina Bezerra, head de conteúdo na StartSe, possui mais de 13 anos de experiência em comunicação, com passagem por veículos como Pequenas Empresas & Grandes Negócios e Época Negócios, ambos da Editora Globo.
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