A lição, entretanto, é sobre como todo o mercado de trabalho tem lidado com a desigualdade salarial entre homens e mulheres -- questão latente ainda em 2022
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10 min
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13 mai 2022
•
Atualizado: 19 mai 2023
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Por Camila Petry Feiler
As desigualdades de gênero no mercado de trabalho são crônicas, mas algumas medidas estão sendo tomadas para que isso mude -- e logo.
O Google, por exemplo, foi acusado por ex-funcionárias de oferecer salários e cargos menores para mulheres apesar de apresentarem experiências e qualificações equivalentes aos homens. A ação foi movida por cerca de 15.500 mulheres, o que marca a violação da Lei de Igualdade Salarial da Califórnia por pagar salários menores para as mulheres — além de violar outras leis estaduais. Por isso, a empresa concordou em pagar uma multa de US$ 118 milhões para por fim a ação.
De acordo com a ação, a companhia pagava cerca de US$ 16 mil a mais aos homens com cargos semelhantes. Assim, o Google pagará em média US$ 5,5 mil para cada uma das funcionárias que sofreu com a discriminação de gênero. Além da multa, a decisão também prevê que um especialista terceirizado analise as práticas de nivelamento de gênero e um economista independente que revise os estudos de equidade salarial da empresa.
Já o LinkedIn chegou a um acordo com o Departamento do Trabalho dos Estados Unidos, depois de ter pago mal 686 trabalhadoras em seus escritórios na Califórnia entre 2015 e 2017.
O valor pago pelo LinkedIn é de US$ 1,8 milhão e surge como equivalência de salário, calculada com juros ao longo do tempo. De acordo com a denúncia, as mulheres recebiam taxas estaticamente bem menores que os homens e trabalhavam em cargos de engenharia, marketing e produto.
Em comunicado, o LinkedIn diz que “embora tenhamos concordado em resolver esse assunto, não concordamos com a posição do governo.” Ainda assim, como parte do acordo, a empresa concordou em enviar relatórios nos próximos 3 anos, enquanto avalia sua política de remuneração e executa um programa de treinamento sobre as “obrigações de não discriminação”.
De acordo com o levantamento da consultoria IDados, com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio do IBGE, as mulheres ganharam em média 20,50% menos do que os homens no 4º trimestre de 2021, contra 19,70% a menos no final de 2020 no Brasil. E piora, viu? Segundo o BNE, a maior diferença se encontra na área de tecnologia: para desenvolvedor front-end, a variação entre os salários em favor dos homens foi de 63,2%.
A disparidade salarial está envolta em “um panorama maior de as mulheres se sentirem em um lugar inferior no mercado de trabalho”, diz Lara Nardy, Head de Inteligência da StartSe. Inclusive porque, de acordo com levantamentos feitos por Lara, as mulheres são recrutadas e avaliadas pelo o que elas já fizeram, enquanto os homens são considerados de acordo com o potencial.
O padrão de cobrança segue alto, injusto e, no fim, com remunerações diferentes. As análises para isso são várias: por questões históricas, onde o sustento era imperativo ao homem da família, por insegurança, já que as mulheres compõem em menor número a força de trabalho, quando não considerada a economia do cuidado, ou mesmo por questões financeiras, afinal, mulheres podem engravidar e tomar a maior parte da responsabilidade sobre os filhos, conforme aponta Lara, exigindo licenças por parte da empresa.
Inclusive, mais de 2,3 milhões de mulheres deixaram a força de trabalho desde o início da pandemia de COVID, em comparação com 1,8 milhão de homens, de acordo com o National Women's Law Center. A questão do cuidado em jogo: elas priorizaram as necessidades da família, como cuidar de crianças ou idosos, e muitas vezes o fazem porque ganham menos do que os homens em suas vidas. E isso gera um ciclo.
Por isso, é preciso olhar para o começo de tudo: a contratação.
Jhenyffer Coutinho fundou a startup Se Candidate, Mulher em 2020, quando o número de mulheres desempregadas era 2 milhões a mais que o número de homens na mesma situação. E por que empregar mais mulheres faz diferença?
Unindo a busca por diversidade nas empresas a necessidade de bons empregos por parte das mulheres, Jhennyffer as fortalece para hackearem o sistema por dentro. Mas a desigualdade salarial pode pesar aqui. Sim, se a reputação da sua empresa está comprometida em relação a isso, provavelmente as mulheres não vão querer se candidatar a vagas nela. “Muita gente me diz: ‘a mulher não se candidata para a minha vaga”, mas a gente esquece o que está por trás da não candidatura”, diz Jhenyffer. Algumas mulheres, em cargos de liderança ou com históricos mais robustos, não se incomodam e pedem para a empresa abrir quanto o homem no mesmo cargo, com equiparação de carreira, ganha, mas nem todas conseguem fazer isso.
Mas quando a mulher descobre um problema salarial e já está na empresa, Jhenyffer diz que ela tem dois caminhos: agir para tentar mudar as coisas ou sair. E aí a empresa perde um talento. Ou ainda tem que lidar com a falta de engajamento da funcionária que, com razão, está desmotivada.
Antes de tudo, é importante reforçar que a mudança depende de todos. Inclusive, a CEO do Se Candidate, Mulher, conta uma experiência de contratação recente com duas empresas que priorizam mulheres na tecnologia. “Na Instrutc, especializada no desenvolvimento de automações e integrações de sistemas, o CEO é super engajado, ele abre o salário desde o processo seletivo e não tem problema de falar disso. Tem também a Pila, empresa recém-investida, que segue o mesmo padrão. E uma coisa que eu acho interessante nesses dois casos é a liderança. Os dois são homens, mas eles focam na transformação e falam abertamente. Inclusive, se uma empresa fala abertamente a faixa salarial, ela está minimamente inclinada a essa pauta.”
Inclusive, um estudo publicado em 2019 pela Harvard Business Review revelou que as disparidades salariais de gênero diminuem quando as empresas são obrigadas a divulgar os salários abertamente. Mas tem outra questão aí: para mais mulheres trazendo a pauta ao centro, é preciso mais mulheres na liderança, um gap no mercado percebido tanto por Lara quanto por Jhenyffer. Lara, inclusive, foi uma das organizadoras da Pesquisa Liderança Feminina, que traz a visão das mulheres sobre os desafios da gestão e você pode conferir aqui.
O que Jhenyffer percebe é que as empresas acabam pegando líderes umas das outras -- e o gap continua. Portanto, é preciso formar mais mulheres líderes e isso pode e deve começar dentro de casa. “Tem demanda de mulheres na tecnologia pleno e sênior. O que eu estou fazendo para aumentar a base?”, questiona.
E para isso começar a acontecer, tanto mais mulheres na liderança quanto equidade salarial, é preciso incluí-las na estratégia da empresa. “Quer começar a fazer a diferença? Inclua nos KPIs, nos OKRs, porque quando aperta, e a gente olha para as metas e se não estiver ali, a gente não vai resolver.” E como toda base de metas, faça uma fotografia do seu contexto hoje, talvez você nem tenha percebido esses problemas ainda, mesmo eles sendo cruciais. A partir daí, as metas criadas podem ser pequenas, mas é preciso começar de algum lutar e ter métricas claras para entender se sua empresa realmente está caminhando rumo à mudança.
Afinal, como lembra Lara, “muitas vezes essas mudanças têm que ser rígidas, se não vamos ter que esperar os 136 anos pra gente ter equidade entre homens e mulheres no mercado de trabalho.”
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Jornalista focada em empreendedorismo, inovação e tecnologia. É formada em Jornalismo pela PUC-PR e pós-graduada em Antropologia Cultural pela mesma instituição. Tem passagem pela redação da Gazeta do Povo e atuou em projetos de inovação e educação com clientes como Itaú, Totvs e Sebrae.
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